Direito e as Necessidades Sociais
Talvez um das maiores dificuldades do Direito seja encontrar o melhor caminho entre as leis e a real necessidade das pessoas, respeitando-se o lado afetivo. Assim, tem ocorrido em muitos temas do Direito de Família, e, em especial, como as decisões judiciais tem permitido que filhos tenham dois pais.
Naturalmente, o direito deve acompanhar as necessidades sociais. Quando o Direito consegue obter resultados positivos atuando em busca das reais necessidades das pessoas, atingindo a finalidade das normas é algo a se comemorar.
Alguns temas são mais sensíveis, como ocorre com o Direito de Família em que o anseio das pessoas está intimamente ligado ao amor e à frustação. Por isso, muitas decisões judiciais tem levado em cosideração o lado afetivo.
Aliás, muitas vezes para questões de família é preciso interagir com outras disciplinas tais como a psicologia.
Parentalidade afetiva e biológica
Por vezes, as pessoas são criadas por pessoas diferentes das que a geraram biologicamente. Nesses casos, laços afetivos são criados e não há como se distinguir ou mensurar qual deve ser o papel mais importante, o da procriação ou, da criação.
Muitas vezes, os filhos nem sequer conhecem os verdadeiros pais biológicos. No entanto, há outras possibilidades como o caso em que os filhos mantêm relacionamento afetivo tanto com o seu pai biológico quanto com o pai afetivo.
Durante muito tempo não era possível considerar a multiparentalidade para assegurar o direito de filiação a essas pessoas que ficavam sem o amparo judicial em seu caso concreto.
Claro que, para a justiça eram casos de difícil solução. Isso porque, além da parte documental da certidão de nascimento, questões de guarda, alimentos e, até mesmo de herança tinham consequências incertas.
Como as decisões judiciais tem permitido que filhos tenham dois pais
Dessa maneira, já existem muitas decisões no Brasil e no mundo, possibilitando que um filho possa ter dois pais, um afetivo e outro biológico.
Aliás, essas são decisões que ainda não possuem lei formal que a ampare, mas demonstram que o Direito acompanha as necessidades sociais. Certamente, os laços de filiação vão muito além do que o legado biológico de cada um. O cuidado, a relação de carinho, respeito vão se construindo ao longo do tempo e, não somente pelos laços de parentesco.
Caso Concreto
Uma recente decisão Argentina, tornou-se notícia dos jornais. A juíza determinou que uma menina de 9 anos pudesse ter no seu acento de nascimento o nome de dois pais além da sua mãe.
A magistrada, por sua vez, teve a sutileza de entender os fatos ouvindo a própria criança além de analisar o caso. A criança passa a semana com um dos pais e o fim de semana com o outro. Ambos demonstravam interesse em cuidar da filha e, a menina não tinha como escolher um deles:
“Juli, tenés razón cuando decís que no querés elegir entre tus dos papás. Tenés derecho a conservar a los dos: al papá Roberto y al papito Jorge. También tenés razón al no permitir a los grandes que te exijan ese tipo de elección. No hay nada que elegir”
Trecho da sentença, disponível em: https://elpais.com/sociedad/2020/02/18/actualidad/1582054530_202102.html, acesso em 21/04/20.
Como as decisões judiciais tem permitido que filhos tenham dois pais
No mesmo sentido, também há inúmeras decisões nos diversos tribunais brasileiros, felizmente.
Em uma delas de São Paulo, o juiz de primeira instância negou o pedido de multiparentalidade argumentando que não havia previsão legal que pudesse amparar tal pedido.
Entretanto, em sede de recurso, Apelação Cível no 1002255-61.2018.8.26.0137, os requerentes recorreram alegando que a multiparentalidade atenderia ao melhor interesse da filha, uma vez que ambos os pais, socioafetivo e biológico gostariam de exercer a parternidade concomitantemente.
Acertadamente, o Tribunal de Justiça de São Paulo reformou a decisão de primeira instância permitindo constar ambos os pais no acento de nascimento da criança.
Breves Conclusões
Por fim, importante que o tema encontre amparo legal. Apesar da jurisprundência já enfatizar a possibilidade da multiparentalidade resguardando-se o melhor interesse da criança, ainda falta abrangência mais ampla.
Caminhar nesse sentido é um avanço e demonstra que o Direito ampara as relações de amor e carinho envolvendo pais afetivos e biológicos. Tantas vezes assistimos situações de abandono e desamparo que, quando há a possiblidade diversa há que se proteger.

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